A LUZ DA NATUREZA
- Em tempos, Ludgero Marques pediu o despedimento de 150 000 trabalhadores da função pública. Para lá caminhamos.
Dei por mim no bulício de animada festa a passar o meu braço em volta de uma árvore, como quem abraça o amigo.
Surreal, foi o momento em que uma cabeça confusa procurava resposta para os porquês desta impunidade colectiva e quase se deixou enlear num diálogo de vivos, eu e a natureza feita árvore.
Assustei-me, reagi perante a sensação de estar a perder a fé humana, submetendo ao arbítrio do vazio aquilo que ao homem pertence.
Criei naqueles instantes uma cumplicidade dolorosa perante a aceitação de um inquestionável bem estar, contido numa mensagem que me transporta par além do real e dá contentamento àquele meu momento.
Pensei nas consequências de me deter a observar o meu estado de alma, da tangível derrocada da obra construída anos a fio, afinal porque escolhi a natureza para ouvir o meu lamento?
Concluo, não sem sentir o frio gélido da desilusão, que o meu habitat há muito deu lugar a novas formas que se afastam decididamente da orla de comprometimentos, que hoje, só mesmo a sábia natureza me garante.
A casca de rugosidade aceitável, tocava os meus dedos de forma imperturbável, enquanto os meus olhos a fitavam na mira de uma reacção à carícia deste suposto velho conhecido.
Hirta e bela, plena de vida na sua copa, subentendi um murmúrio de compaixão perante a fragilidade do meu ser e um sorriso cúmplice que me elevou ao cimo dos seus frágeis ramos e me concedeu a graça de partilhar da sua liberdade - natureza.
A árvore, essa força que cresce quase imparável rumo à luz. Essa luz que é a seiva que nos alimenta e a bússola que deveria orientar-nos.
Procurar a luz é dar espaço à vida, é empreender uma jornada rumo ao conhecimento, é, afinal, crescer sem conta nem tamanho, buscando no exemplo deste elemento da natureza a graça que o homem deve conceder a si próprio, morrer, como diria Palmira Bastos, de pé, como as árvores.