O DIREITO A ABRIL
Sem grandes preocupações de sacrossanto rigor, apetece-me experimentar o desespero de comparar as comemorações do 25 de Abril à comemoração Natalícia.
Em qualquer destes momentos, sente-se o cheiro bafiento do gesto calculado, capaz de nos fazer sentir os melhores do mundo e apagar das nossas consciências todo o tempo feito de traidoras subtilezas, artifícios de amizades e abraços que magoam.
Em qualquer destes momentos, sentimos com igual intensidade o peso da hipocrisia.
O gesto com que nos confrontamos uns aos outros é instantâneo e quase tão convincente que até nos deixamos enlevar pelo virtuosismo da honestidade.
Resta-nos, para desmontarmos o trama, recuarmos um pouquinho no tempo, para sentirmos um incontível desejo de não repetir.
É o cumprimento de Natal que precede mais um ano cheio dos mesmos desencantos, das mesmas contradições, do mesmo egoísmo e das enumeras traições à amizade.
A comemoração do 25 hoje, aparte a apropriação de índole pessoal feita de convicções, é uma perversão do ideário colectivo que dele fez bandeira.
Desde a objectiva condescendência para uma liberdade que o 25 de Abril tornou diferente, exercemos hoje o único gesto de liberdade, restante de tantas promessas que a alvorada nos trouxe, o exercício de votar.
Mas, mesmo o direito de voto, foi sendo sucessivamente manipulado e controlado que, em bom rigor, poderemos ter legitimas dúvidas se, também aqui, a liberdade não nos vá faltando.
Os mais elementares direitos de cidadania, consagrados na Constituição da República, são-nos sistematicamente cerceados, sendo disso exemplo mais recente a exclusão do povo de pronunciar-se sobre o tratado de Lisboa.
São artifícios políticos que nos revelam a fragilidade dos direitos que todos enunciam, mas, facilmente aniquiláveis perante um pequeno pelotão de agraciados, que se julgam detentores de bons ofícios, sábias opiniões e do direito de decidirem em contradição com os ideais democráticos que nos foram prometidos.
De um ano ao outro, até nova comemoração, fazemos por esquecer os tiques da ditadura que muitos de nós personificam, olhamos sobranceiramente a inteligência da idade e procuramos usá-la em benefício de causas que, não são mais que o aproveitamento dos destroços do Abril que ajudaram a destruir.
Num ano e noutro, sucessivamente, vemos os sobas e os candidatos a tais, tratarem com ousada estupidez, todos quantos, não servem obedientemente os seus desígnios ou, aqueles outros, só porque o mundo os acolheu mais tarde, entendem como lixo os que assomaram primeiro.
O Abril que eu canto e que assim entendi, fala-nos de tempos de fraternidade, de respeito pelo outro, da observância atenta e contida da nossa e da inteligência do semelhante, independentemente do seu estatuto social, da sua fé, do seu credo político ou até do seu grau académico.
Não te julgues bem e apressadamente, olha o outro, porque o 25 de Abril de 1974, não estabeleceu limites, antes pelo contrário, rasgou horizontes, assim sejamos capazes de ver mais além, em nome do respeito e da dignidade humana.
Ainda sou capaz de caminhar.
11 Comments:
Senhor Ilídio, li o seu texto e há uma coisa que eu não percebo. O senhor diz que ainda é capaz de caminhar. Estamos de acordo. Mas, diga-me, para onde é que o senhor caminha? Quais são os seus objectivos políticos? Julgo que terá toda a legitimidade para os ter, dado que é um homem inteligente e de elevado nível cultural. Mas diga-me, por que partido é que o senhor vai concorrer? Julgo que a nossa terra precisava de um homem com as ideias iluminadas do senhor, que funcionasse como contra-poder. Mas somente para isso, porque julgo que da maneira como o senhor escreve, dá ideia que está contra-tudo e contra todos. É Deus no Céu e Ilídio dos Santos na terra. perdoe-me a ousadia, mas embora concordando com muitas coisas que o senhor diz, acho-o execessivamente radical e julgo que com as suas ideias teria grandes dificuldades em convencer alguém a acompanhá-lo na sua causa. leio os seus artigos no Jornal e vejo-o a denunciar luxos e mordomias. Aí estamos de acordo. Mas sinto também em que tudo o que o senhor escreve, há uma revolta interior, um ressabiamento. Contra quem ou contra quê ainda não consegui perceber, porque o senhor por vezes não é directo nas críticas. Quero acreditar que o senhor respeita e defende a Liberdade dos outros, mas a imagem que transmite é que está sempre do lado do contra. Contra-poder e contra oposições. Com pessoas a pensar como o senhor, julgo que a democracia teria grandes problemas em se afirmar. não me leve a mal, mas o seu pensamento está próximo da anarquia, não acha?
O 25 de Abril não estabeleceu limites à liberdade, mas todos nós por uma questão de bom senso, devemos ter consciência das nossas próprias limitações. Falo como simpatizante e votante no actual Presidente da Câmara e não tenho medo de o assumir, pelo muito que foi feito nesta terra nos últimos anos. Acho que o senhor dentro do nosso partido enquanto aqui esteve foi sempre um crítico mas sem ser solidário com ninguém. Aliás nunca o foi, criticando sempre sem apresentar soluções. Nunca deu valor ao Eng. barreto que eu me recorde e lembro-me que o senhor uma vez escreveu no Ecos de basto que se o presidente não se recandidatasse estava disponível para ser o candidato do partido socialista, nunca perguntando se tinha apoios para tal. Ora isso não me parece que seja muito correcto. O senhor pôs-se em bicos de pés, nessa e noutras alturas. Numa coisa o senhor tem razão. O 25 de Abril deu-nos liberdade pra tudo, até para fazermos figuras ridículas. Somos livres de nos apresentarmos como candidatos, mas temos que entender e perceber a liberdade dos outros têm em decidirem nos apoiar ou não. Acho que o ilídio, não tem consciência das suas próprias limitações e todos nós já percebemos que o que o senhor quer é um cargo na Câmara ou noutro sítio qualquer. Mas duvido que o consiga, pois acho-o um homem que arrasa tudo e todos e dessa maneira espanta a caça toda.
Caro G. lopes, eu acho que todos devemos ter cuidado, quando falamos ou invocamos o 25 de abril. Hoje o 25 de Abril é invocado para quase tudo, mas o que nós vemos na prática é uma subversão completa dos princípios democráticos. O desenvolvimento não é só obras. o desenvolvimento também se faz com actos e cidadania e com respeito pelas ideias dos outros. olhe para o terrorismo judicial que presidente faz com as pessoas que discordam das suas ideias, olhe para o que se passa em passos que uma junta eleita ainda n conseguiu aceder ao edifício da freguesia e olhe por exemplo prás reuniões de câmara onde não há discussão e onde o presidente da câmara instaurou a lei da rolha, suprimindo o período de antes da ordem do dia. Como vê, não faltam desvios à liberdade e ao atirarmos pedras devemos olhar para o nosso umbigo.
Ilídio, faça um favor aos cabeceirenses e a quem governa com sabedoria, democracia e bom senso. Dedique-se à pesca, e não se meta em política! Fartos de iluminados e salvadores da pátria estamos nós.
A última pessoa neste concelho de quem o sr. Ilídio devia ter razões de queixa era do nosso Presidente da Câmara. Senhor Ilídio seja solidário e lembre-se de quem o ajudou. Ou será que o senhor se esqueceu de quem meteu o seu filho na Câmara? Por uma vez na vida seja grato e solidário com quem o ajuda e saia do seu pedestal.
Curiosamente o meu Pai chama-se Ilídio e o meu filho também se chama Ilídio! Viva o 25 de Abril SEMPRE! Um tempo de saudade, um tempo onde ainda acreditávamos na esperança. Boa semana.
O senhor Lopes critica quem tem a coragem de fazer frente ao unanimismo e à autocracia que reina em Cabeceiras e chama a isso “colocar-se em bicos de pés”, sem cuidar, pelos vistos, que “colocar-se em bicos de pés” não é desonra para homem nenhum. Quanto muito, inoportunidade política. Já o mesmo não se poderá dizer dos que baixam as calças com uma mão e seguram o chapéu com a outra, reverenciando acéfala e servilmente o poder que os alimenta. Isso sim, é uma desonra e uma vergonha para qualquer verdadeiro democrata e homem de bem.
E já agora saiba de outra coisa, senhor Lopes: um Homem que não tem consciência das suas próprias limitações é o que está mais perto de ascender à Liberdade. Os outros, os que vivem sob o peso e o espartilho da consciência dos os seus limites são os escravos eternos. Os que não contam para nada.
Francisco, já agora diga onde é que você trabalha e que foi que o meteu lá. E aproveite para dizer quem realmente é, pois essas acusações sob a capa do quase-anonimato são uma cobardia para a qual já não há paciência e de que a nossa terra está cheia.
Senhor G Lopes
Apetece-me dizer: de Pé ó Vítimas da Opressão.
A blogosfera é um espaço que se quer de liberdade e que serve, no limite, para que alguns saiam do casulo e a experimentem.
O texto a que presumidamente responde foi, naturalmente esquecido, limitando-se o Sr G Lopes a saltar do pasmaceiro comboio da linha do Corgo, dar o recado próprio de aguadeiro e acantonar-se de novo no granel da carruagem.
No seu óbvio incómodo, esconde frustrações inconfessáveis e distorce a verdade.
Fora o artigo “Os Utopianos” que alguém censurou em nome da liberdade que tão pressurosamente defende, nunca escrevi no Ecos de Basto nada que pudesse sugerir o desejo de qualquer candidatura.
Nessa matéria, sugiro-lhe que peça ao seu presidente que o esclareça.
De resto, a cidadania, conceito que o sr Lopes deve conhecer, consagra direitos a que ninguém pode obstar e, quanto aos apoios necessários a uma candidatura, há, em certos círculos, muito gente disposta a não pensar. Basta que um pense.
Ridículo?...Que hei-de dizer-lhe sem descer lá abaixo, Sr Lopes?
Só me ocorre que andar em bicos de pés é um jeito que tenho e me mantém a coluna erecta, postura que cultivo e me põe a salvo de um qualquer atrevido preguiçoso que não goste de andar a pé.
Apesar das minhas limitações, que tão lucidamente o sr Lopes põe em destaque, permito-me recordar-lhe que, nos tempos em que eu militava no seu partido, nunca me deu a entender essa minha frágil condição. É que para alem das limitações próprias de cada um, sobra-lhe a si sr Lopes, o constrangimento que é não ter opiniões autónomas.
Diferença substancial, convenhamos.
Quanto ao lugar na Câmara que diz que procuro, uma vez mais se coloca uma questão fundamental na política, tal como a entendo, verdade.
A única verdade a esse respeito é que houve um momento em que me foi oferecido um lugar de relevo que declinei.
Aceitemos democraticamente as nossas diferenças.
Meu caro leitor Manuel S Pereira
O nosso problema de dificuldade comunicacional reside, fundamentalmente, em razões de objectividade.
Aceitando, embora, que comece o seu comentário pelo fim do meu escrito, resulta para mim evidente que, tendo em conta que me lê, ainda não quis apanhar o fio à meada.
A democracia é um conceito muito lato, porventura, do seu ponto de vista, até vivemos em democracia, pois, para mim, não.
Repare que, nem a circunstância de fazermos uma escolha pelo voto, nos garante coisa alguma.
Apesar de todas as contra indicações que coloca a uma candidatura que não existe, sou levado a admitir que o sr Pereira dela faz apologia e, já agora, deixe-me dizer-lhe que, no meu espírito permanece aberto e em luta o caminho das causas humanistas e universais que dão conteúdo à minha linha de orientação política.
Causas consagradas na Carta Universal dos Direitos do Homem, tais como, o direito a viver com dignidade e a não ser explorado.
Comece daqui e terá muito caminho para caminhar.
E possível?... Não é possível?... E depois?... que me interessa a mim?... Só defendendo princípios e valores humanos, a luta vale a pena.
Reger-me por cartilha que, muitos de nós, conservam sempre à mão, é um processo de auto aniquilação, pois que, quando chegamos a este mundo, não trazemos nenhum livro debaixo do braço.
Por outro lado, meu caro sr. Pereira, convirá que “iluminado/inteligência/cultura” podem ser subtis ingredientes que colocam dúvidas quanto à vontade de fazer uma critica construtiva.
Penitencio-me se a intenção for boa, mas, por via das dúvidas e para desfazê-las, sempre direi que os adjectivos com que me premeia, são-lhe devolvidos para que desse lado da barricada defenda com igual intensidade os valores da democracia e liberdade que entenda adequadas.
Sr. Pereira, lançar um olhar sobre a nossa realidade, obriga-nos a reflectir sobre a saúde que não temos, a educação que não temos e o emprego que não temos.
Acrescente 2 milhões de pobres e 65% da riqueza produzida no país nas mãos de 2,5 milhões de portugueses, como diria o outro, é fazer as contas e veja o que sobra.
No politicamente correcto alguém se incomoda com isto?
Há causas pelas quais vale a pena caminhar, apesar das suas pessoais e legitimas dúvidas.
Quanto à minha oposição ao poder e à oposição, assim à moda de anarquista como diz, resulta evidente que o sr Pereira entende que as duas coexistem, ora, nada mais enganador. É esta diferença de perspectiva que nos coloca em pólos diferentes.
Para resumir, descontados os aspectos mais irrelevantes do seu comentário, continuo a pensar que: Não vivemos em democracia tal como tem que ser entendida, nem temos oposição, só poder estruturado e estruturante.
Basta-me para continuar a caminhar
Sr Francisco P
Até que enfim!...
Se um modesto lugar, igual a tantos outros que o segredo guarda, implica perda de liberdade e de consciência, pergunto:
Quanto paga o Francisco e em quantas prestações?
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